Em um desdobramento significativo sobre políticas de cotas raciais no Brasil, o juiz de Direito Randolfo Ferraz de Campos, atuando pela 14ª vara da Fazenda Pública de São Paulo/SP, concedeu uma liminar determinando que a Universidade de São Paulo (USP) garanta a matrícula de Glauco Dalalio do Livramento. Glauco, um jovem que concorreu a uma vaga no curso de Direito da USP por meio do sistema de cotas raciais, foi inicialmente excluído por não ser considerado pardo pela comissão de heteroidentificação da universidade.
O caso ganhou notoriedade após o estudante ser aprovado em primeira chamada no Provão Paulista, um processo seletivo destinado exclusivamente a alunos da rede pública que também se autodeclaram pretos, pardos ou indígenas (PPIs). No entanto, após declarar-se pardo, Glauco enfrentou a discordância da comissão de heteroidentificação da USP, que, baseando-se em uma fotografia e uma videochamada de um minuto, decidiu que ele não se enquadrava nos critérios estabelecidos para tal classificação.
O jovem então decidiu buscar a justiça, argumentando que o procedimento adotado pela universidade para verificar sua autodeclaração de cor era tanto ilegal quanto inconstitucional. Em sua decisão, o juiz Randolfo Ferraz de Campos apontou que o método utilizado pela USP “ofende a isonomia”, ressaltando que as imagens geradas por equipamentos eletrônicos podem não ser fiéis à realidade e que a decisão da comissão foi tomada por maioria de votos dos presentes, deixando em aberto a questão de se o resultado seria o mesmo em uma sessão presencial.
Além disso, o juiz destacou a complexidade de avaliar o pertencimento racial à distância, considerando que fotografias podem variar significativamente. Ele reforçou que, sendo Glauco filho de uma pessoa negra, o critério adotado pela USP não parecia razoável, principalmente para uma aferição feita à distância.
“Ao que parece, não se querendo aqui pura e singelamente substituir as bancas julgadoras administrativas, não se pode mesmo olvidar que o autor é simplesmente filho de pessoa de raça negra, e eventualmente imagens que ora o favoreçam, ora não, na conclusão de pertencimento à raça negra, seja preta ou parda, não parece aqui ser um critério razoável em contexto como este, quanto menos para aferição à distância.”
Por fim, a decisão liminar enfatizou o risco de “prejuízo irreversível” caso Glauco fosse excluído do curso universitário para o qual já havia realizado pré-matrícula. “O perigo da demora é inerente à própria exclusão do curso universitário para a qual, inclusive, já tinha se pré-matriculado, dada a sequência que terá, o que poderá implicar prejuízo irreversível.”
- Processo: 1013167-68.2024.8.26.0053
- Leia a liminar.