Danton Leonel de Camargo Bini*
A economia, em sua dinâmica de permanente reajuste entre a oferta e a demanda e de seu acúmulo desigual de capital e investimento entre os setores, possui uma característica de viver ciclos que flutuam entre momentos de pujança, crescimento, desenvolvimento e momentos de declínio, desemprego e ajustes estruturais.
Comprovado estatisticamente por Nikolai Kondratiev (1892-1938) na análise da crise mundial de 1929, fatores tecnológicos que impulsionam a construção de rearranjos sem garantias sociais consolidadas, ao gerarem concentração da riqueza e desigualdade, tornam-se a pólvora para a eclosão de um ciclo de recessão econômica. No final de 2019, 90 anos após a maior crise da história do capitalismo, o coronavírus desponta como propulsor do aprofundamento de um novo processo de depressão social e econômica.
O mundo passou toda a década anterior tentando se reerguer da recessão iniciada em 2008. Chamada de marolinha na época por Lula e seus seguidores, a crise arraigada com os desajustes nas contas públicas derrubou Dilma Rousseff e colocou o Brasil na rota de uma reestruturação administrativa do Estado que foi representada por uma reforma trabalhista nos anos do governo de Michel Temer. Numa proposta liberalizante da economia, Jair Messias Bolsonaro, sob o pacote de medidas apresentado pelo ministro Paulo Guedes, iniciou seu mandato em 2019 implementando uma contração do gasto público bastante impopular e uma reforma da Previdência que deu sinais que agradaram o mercado internacional.
O ano de 2020 foi inaugurado com sinais esperançosos para muitos analistas e estudiosos, principalmente os defensores do liberalismo. Teve carnaval. E o tsunami invisível trazido do Oriente desabou as convicções daqueles que pregavam que o Estado e o serviço público serviam unicamente para atender interesses espúrios. Num momento no qual a fome e a miséria voltam a sondar o radar, para a tristeza de muitos, as instituições mais preparadas para atender os anseios e os desafios que virão são os governos nas esferas federal, estadual e municipal.
Mesmo com a manifestação solidária de empresas e investidores de todos os portes, como a bela atitude do supermercado Bandeirante na doação de 10 toneladas de alimentos ao Fundo de Solidariedade de Birigui, mais do que nunca, a esfera pública, através dos recursos dispostos à coletividade, apresentar-se-á como o espaço de centralização da gestão da crise e de sua superação. O auxílio federal de R$ 600 não será suficiente. A filantropia e o assistencialismo (potencializados em ano eleitoral) não serão suficientes. Suplementações do governo estadual e municipal, como a Merenda em Casa, não serão suficientes.
Que o isolamento social daqueles que alcançam as refeições necessárias para a subsistência sirva como tempo de reflexão para o protagonismo que não nos furtaremos de realizar. Aos miseráveis famintos, restarão a solidariedade alheia ou a convulsão social.
Danton Leonel de Camargo Bini é pesquisador científico do Instituto de Economia Agrícola (IEA) e doutor em Geografia Humana.