Maria Aparecida Cândido dos Reis, uma aposentada de 80 anos, teve um filho há 47 anos, na Santa Casa de Araçatuba, e após o parto, recebeu a triste notícia de que o bebê havia nascido morto. Ela não chegou a ver nenhuma documentação e muito menos o corpo de recém-nascido, e por quatro décadas viveu esta grande dúvida, do que realmente teria acontecido.
Por outro lado, o policial militar Marcelo Abrão ficou sabendo, aos 47 anos, que era filho adotivo, e ao buscar a história de sua origem, descobriu que ele era o filho que a dona Maria Aparecida nunca acreditou ter morrido no parto.
Esta história que daria o enredo de uma novela aconteceu em Araçatuba e ficou guardada por mais de um ano, até que chegou ao conhecimento da imprensa esta semana. O mais curioso de tudo isso, é que Marcelo, além de encontrar a mãe biológica, descobriu que tinha mais cinco irmãos, e já conhecia três deles, e nunca imaginou que seria um familiar tão próximo.
A reportagem do REGIONAL PRESS tomou conhecimento do caso por um dos irmãos de Abrão, o conselheiro tutelar Carlos Cândido Lacerda, 47 anos. Até hoje ele se emociona ao relembrar o caso, e acha que estava na hora de divulgar e mostrar para as pessoas que é preciso ter esperança e correr atrás dos sonhos.
Marcelo Abrão concordou em conversar com a reportagem do REGIONAL PRESS para contar sua história. Ele disse que foi criado por um casal, o pai era pedreiro e a mãe foi funcionária da antiga Telesp e também trabalhou como babá. Ele teve uma boa criação, concluiu os estudos e virou policial militar, casou e tem duas filhas.
Ele não sabia que era filho adotivo. No ano passado o pai faleceu e sua mãe, sem coragem para contar, pegou um termo de adoção, de 1971, e entregou para a esposa dele, dizendo que ele era adotivo, que precisava contar, mas não tinha coragem. O documento ficou guardado por 47 anos até ser entregue para a esposa de Abrão.
Foi ela quem ficou com a missão de entregar o documento ao marido. Abrão conta que é um termo de adoção datilografado, que tem a assinatura de sua mãe, onde ela concede a adoção do menino para o casal. Com o nome da mãe, ele decidiu ir em busca de suas origens.
Com ajuda de amigos do meio policial, ele conseguiu localizar cinco mulheres com o nome de sua mãe biológica, sendo quatro em Araçatuba e uma em Valparaíso. Ele confessa não ter tido coragem de investigar e pediu ajuda a dois amigos policiais, que se incumbiram de ir atrás destas mulheres e ouvir a história de cada uma delas.
E foi nas conversas que foram feitas as eliminações até se chegar a dona Maria Aparecida, que mora no bairro São Vicente, em Araçatuba. Durante uma das visitas dos dois amigos a mulher que seria a mãe biológica de Abrão, eles conheceram uma das irmãs dele, a auxiliar administrativo Gislene Cândido Lacerda da Silva, 44 anos. Foi ela quem deu total abertura para a aproximação de Abrão e falou com os demais familiares.
O ENCONTRO
Após várias conversas foi marcado o encontro de Marcelo Abrão, a possível mãe biológica e aqueles que seriam seus cinco irmãos. Quando Abrão chegou na casa de Dona Maria Aparecida e entrou na sala, ela olhou e disse que ele era seu filho.
A aposentada contou que apertava as pernas dele para ver se era verdade. Ela disse que no fundo, nunca acreditou que seu filho teria morrido no parto. Gislene disse que a feição, principalmente na região dos olhos de Abrão, são idênticas a da mãe e um dos irmãos.
DNA
Diante de todas as evidências, Abrão sugeriu que fosse feito o exame de DNA, e explicou que precisaria coletar material da mãe ou de algum dos irmãos. A aposentada disse que por ela nem precisaria de exame porque o instinto de mãe já tinha confirmado que o policial militar era realmente o filho que havia “perdido” há 47 anos.
No entanto, disse que se fosse para fazer o exame, faria questão que fosse com material coletado dela, e não de um dos filhos. Eles fizeram o exame e, como já era esperado, o resultado foi positivo.
“Eu era filho único e tinha apenas a minha mãe. Agora tenho duas mães, cinco irmãos e vários sobrinhos”, disse ele.
CONHECIA OS IRMÃOS
O irmão Carlos Lacerda se emociona ao lembrar da história. Ele disse que o mais curioso de tudo isso, é que ele conhecia seu irmão sem saber deste vínculo que eles tinham. Na época em que trabalhou no Ministério Público, Lacerda fazia atendimento e por várias vezes atendeu Abrão.
O outro irmão, Wagner Cândido, também conhecia Abrão de vista, porque ambos estudaram na mesma época no Instituto educacional Manoel Bento da Cruz (IE), mas por serem de séries diferentes, não andavam juntos.
Abrão contou que também conhecia de vista um tio, irmão de sua mãe, que também é policial militar e está aposentado.
MOTIVO DA ADOÇÃO
Abrão disse que não sabe exatamente o que pode ter acontecido. No entanto, dona Maria Aparecida e a filha Gislene tem uma versão para o caso. Na época, dona Maria era viúva e tinha dois filhos, e apesar de não estar casada, apareceu grávida do terceiro filho, que seria o Marcelo.
Os pais na época esconderam a gravidez de dona Maria e na versão dela e da filha, quando Marcelo nasceu, foi colocado para adoção. Nem os irmãos de dona Maria sabiam da história, e nunca souberam que ela ficou grávida e havia “perdido” o bebê.
Dona Maria conta que sua mãe reclamava que não iria ter como sustentar mais uma criança. Eles acreditam que ela assinou o termo de adoção sem saber o que estava assinando, acreditando ser documento para ter alta.
Marcelo disse que a versão que ouviu, era de que a mãe não podia ter filho e na época havia um orfanato ligado a Santa Casa, para onde iam os bebês cujas famílias não assumiam. Uma enfermeira, na época, teria dito a mãe de criação de Abrão que tinha uma criança disponível, e ela acabou adotando.
Abrão disse que ama sua mãe de criação, e agora está também se aproximando da mãe biológica e de seus irmãos. Segundo ele, todos foram muito receptivos e está se dando muito bem com seus irmãos, os quais encontra com frequência.
A PROCURA
Dona Maria Aparecida disse que quando ficou internada e teve alta, sem o bebê, desconfiada, ela passou a vagar diariamente pelas ruas da cidade a procura do filho que não acreditava estar morto. Era o instinto materno que já se aflorava e sempre se manteve na mente dela.
“Eu saia e andava por todos os bairros da cidade e acreditava que ia encontrar meu bebê. Quando chegava de volta a noite, sempre apanhava da minha mãe. Depois me levaram embora para São Paulo”, lembrou emocionada. Em São Paulo ela se casou de novo e teve mais quatro filhos.
Ela morou por três décadas na capital paulista e retornou a Araçatuba, onde acabou perdendo o filho caçula, que foi assassinado aos 24 anos.
TRATAMENTO
Dona Maria Aparecida enfrentou uma luta contra um câncer há três anos, passou por duas cirurgias e perdeu mais de 30 quilos, ficando bastante debilitada. Ela começou a se recuperar e agora está ainda mais motivada com a descoberta do filho que tentaram fazer ela acreditar que havia perdido há 47 anos.