A paixão pelos carros leva muita gente a colecionar relíquias e a investir na recuperação de raridades que, na mão de especialistas, voltam a funcionar perfeitamente com itens originais.
Mas o que moveu o advogado Marco Aurélio Rodrigues dos Santos, 46 anos, a investir R$ 50 mil na restauração de uma Caravan, ano 1977, de cor amarela, foi o amor e a vontade de realizar o sonho de seu pai, Milton Mendes dos Santos.
A relação da família com o veículo teve início há exatos 42 anos, na concessionária J. Dionísio, que ficava na rua Olavo Bilac com a Floriano Peixoto, centro de Araçatuba. Naquele ano, seu Milton conseguira realizar o sonho de comprar uma Caravan de luxe completa.
Durante quase 20 anos o carro fez parte dos momentos mais felizes da família. Foi nele que, aos 12 anos, Santos aprendeu a dirigir e, em seu toca-fitas, ouvia músicas de Raul Seixas com os amigos.
Era nele também que a família ia para Campos do Jordão, para a praia e para outros destinos durante as férias escolares.
Apelidado de barca, o carro garantia o conforto da molecada durante as viagens, pois o pai deitava o banco traseiro e transformava o espaço em uma cama para os filhos.
Seu Milton era o motorista do filho e de seus amigos na hora de levar e buscar a meninada das baladas. Aos finais de semana, Santos acompanhava o pai na manutenção do veículo, colocava água no radiador, mexia no carburador, trocava velas.
Com o pai, adquiria os conhecimentos de mecânica e aprendia lições de como ser bom de volante. Em 1992, por problemas financeiros, seu Milton teve de se desfazer do carro.
Vendeu para um familiar, mas sempre se ressentiu de ter se separado da velha Caravan e acalentava o sonho de ter o veículo de volta.
SONHO
O sonho do pai de reaver o carro que tanta felicidade proporcionou à família levou o advogado a comprar o veículo de volta, em 2015.
A alegria de reviver todas as histórias passadas com aquele carro foi, ao mesmo tempo, um momento de tristeza e reflexão, pois seu pai, então com 75 anos, foi diagnosticado com um tumor no cérebro uma semana depois.
Sem perder tempo, o filho passou a investir na recuperação e restauração do veículo, que estava bem avariado, nem assoalho tinha e não andava mais. O processo envolveu várias etapas.
A concessionária que havia vendido o carro para seu Milton desmontou todo o carro, que ficou só na carcaça e foi levado para a funilaria.
Lá, ganhou um novo assoalho, de um material antiferrugem, uma nova caixa de ar nas latarias laterais, onde fica o estepe. A pintura, foi feita com tinta original, feita pela General Motors, fabricante da Caravan.
Depois, o carro foi para a mecânica. Foi colocado motor, suspensão, a parte hidráulica, freio. Tudo providenciado pelo mecânico mais antigo da J. Dionísio, José Nilton. “Ele viu o carro nascer, se acabar e renascer. Ficou muito emocionado, chorou feito criança”, conta Santos.
Em seguida, o carro ganhou uma nova parte elétrica e tapeçaria, voltando para a pintura, para novo polimento. Foram três anos para reformar a Caravan, que ficou pronta em março de 2018.
A peça mais difícil de encontrar foi a tampa do tanque do combustível. Foi ela também que mais teve a participação do pai, que buscou a peça em um ferro velho e encontrou, segundo Santos, que chora ao se lembrar.
SAUDADE
Hoje, Dia dos Pais, Santos sente um misto de dever cumprido e saudade. Seu pai não teve tempo de ver o carro recuperado. Ele faleceu no dia 21 de dezembro de 2017, após sofrer um AVC hemorrágico e ficar 44 dias na Unidade de Terapia Intensiva.
Após o falecimento do pai, o filho continuou trabalhando na recuperação do carro, concluída em março de 2018. Com os R$ 50 mil investidos, poderia ter adquirido um carro novo, mas não se arrepende de ter realizado o sonho paterno, mesmo não conseguindo concretizar o plano de homenagear o pai com a entrega da chave para ele, novamente, na mesma concessionária onde foi adquirido.
A última vez que seu Milton viu o carro foi em 10 de agosto de 2017, antes de se internar para passar por uma cirurgia no cérebro.
A velha (nova) Caravana amarela, fica, hoje, na garagem do edifício onde Santos mora. Aos fins de semana, ele circula pela cidade com o carro, chamando a atenção pela cor e estado de conservação, com 92% de originalidade.
“Sentimos a presença de meu pai toda vez que saímos com a Caravan, o que nos leva a crer que o amor por um carro se transferiu para os filhos e faz com que ele esteja sempre entre a gente”, finaliza Santos.