A Vigilância Sanitária de Araçatuba emitiu um relatório atestando a regularidade no funcionamento de um restaurante de culinária japonesa após a morte da jovem Bárbara Celloni, de 25 anos, vítima de intoxicação pela bactéria botulínica. Diferente do que foi publicado anteriormente, o órgão não emitiu um laudo isentando o estabelecimento em relação ao caso, mas sim um relatório sobre as condições sanitárias do restaurante (veja a íntegra da nota abaixo). O estabelecimento foi vistoriado nos dias 11 e 19 de março, e o relatório atestou condições adequadas de funcionamento, com alimentos dentro do prazo de validade e licenças regularizadas.
Bárbara jantou no local um dia antes de passar mal e morreu quatro dias após ser internada na Santa Casa de Araçatuba. O relatório, ao qual a reportagem do RP10 teve acesso, afirma que o local possui licença sanitária válida e segue as normas de boas práticas de manipulação de alimentos.
“O estabelecimento possui Licença Sanitária vigente, por meio do Certificado de Licenciamento Integrado – CLI. A.B.J Fiscal Sanitário F.H.T.C.M Fiscal Sanitário Houve inspeção sanitária no local, conforme determina o artigo 69 da Lei 10.083 de 23/09/1998, do Código Sanitário Estadual. O relatório de inspeção, atesta a situação sanitária no ato da vistoria, mencionando documentos solicitados e apresentados, a fim de verificar as Boas Práticas de Manipulação de Alimentos, de acordo com o que preconiza a Portaria CVS 05/2013”, afirma o laudo.
Alimentos e procedimentos em conformidade
O documento destacou que os produtos estavam armazenados corretamente, com peixes e camarões conservados em freezers e devidamente etiquetados. O salmão, recebido semanalmente em caixas de isopor com gelo, era limpo antes do armazenamento. Além disso, o restaurante mantém amostras dos pratos por 72 horas, conforme exigido pela legislação.
“Os produtos estavam armazenados em prateleiras, no prazo de validade. Os alimentos que estavam em geladeira e freezer, estavam etiquetados com data de validade, sendo que os peixes e o camarão estavam armazenados nos freezeres. Os produtos de origem animal possuem selos de registro nos órgãos de inspeção (SIF, SIE/SISBI, SISP). O salmão é recebido semanalmente, às terças e/ou quartas-feiras, em caixas de isopor com gelo, os funcionários realizam a limpeza e, posteriormente, armazena-se em freezer. Os pratos são preparados diariamente e conforme a demanda. Além disso, o estabelecimento realiza a guarda de amostras por 72 horas, conforme consta na Portaria CVS nº 5/2013”, mostra o documento.
Os advogados Sérgio Matheus e Breno Alexandre da Silva Carneiro, defensores do estabelecimento, afirmaram que o restaurante está isento de qualquer culpa por possível contaminação e que outras cinco pessoas – incluindo uma criança – consumiram os mesmos pratos que Bárbara sem apresentar sintomas. “A bactéria afetaria a todos. Como apenas ela adoeceu, é claro que a contaminação ocorreu em outro local”, disse Matheus.
Ataques nas redes sociais e ações judiciais
Os representantes do restaurante informaram que moveram ações contra internautas por difamação nas redes sociais. Comentários acusando o estabelecimento foram gravados e servirão de base para processos, alguns já em andamento.
Queda nas vendas do setor
A divulgação do caso impactou negativamente restaurantes japoneses da cidade, com queda abrupta no movimento. Um fornecedor de peixes afirmou que não fez entregas na cidade na semana passada, e comerciantes relataram dificuldades financeiras. “Não sei como pagarei fornecedores e funcionários”, disse um empresário que preferiu não se identificar.
O setor alega estar sofrendo as consequências de uma associação indevida, já que o relatório não aponta falhas no restaurante frequentado por Bárbara.
Nota da Vigilância
A Vigilância Sanitária, por meio da assessoria de imprensa da Prefeitura de Araçatuba, enviou uma nota ao RP10 após a publicação da matéria. Eis a íntegra do comunicado:
Não houve “laudo isentando o estabelecimento em relação ao caso”, mas um relatório de inspeção no local, conforme determina o artigo 69 da Lei 10.083 de 23/09/1998, do Código Sanitário Estadual. O relatório de inspeção atesta a situação sanitária no ato da vistoria.
Foram analisados documentos referentes às Boas Práticas de Armazenamento e Manipulação, as condições sanitárias do local, além da existência de Licença Sanitária, que encontrava-se vigente no ato da inspeção. Não foram encontradas irregularidades no ato da inspeção sanitária.
Não houve coleta de alimento porque não havia mais amostra. Pela legislação vigente, a guarda de alimentos é por 72 horas.
O alimento foi manipulado no dia 5 de março, mas a notificação sobre a suspeita de botulismo foi oficializada junto à Vigilância Epidemiológica e Sanitária apenas no dia 10. Nesse mesmo dia, a fiscalização esteve no local, mas encontrou o estabelecimento fechado, por se tratar de uma segunda-feira, dia de folga do estabelecimento. Os fiscais retornaram no dia seguinte, uma terça-feira, e fizeram a inspeção. O estabelecimento estava de acordo com as normas de vigilância.
A Vigilância Sanitária ainda não concluiu a investigação porque está aguardando o resultado do exame na vítima para confirmar a suspeita de botulismo.
O que é botulismo
De acordo com a Biblioteca Virtual em Saúde, do Ministério da Saúde, o botulismo é uma doença bacteriana grave, não contagiosa, causada pela ação de uma potente toxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum, encontrada no solo, nas fezes humanas ou de animais e nos alimentos. A doença pode levar à morte por paralisia da musculatura respiratória.
Transmissão
A bactéria causadora do botulismo produz esporos que sobrevivem até em ambientes com pouco oxigênio, como em alimentos em conserva ou enlatados. Ela produz uma toxina que, mesmo se ingerida em pouquíssima quantidade, pode causar envenenamento grave em questão de horas.
Além disso, os esporos desta bactéria existem na natureza, como em solos e sedimentos de lagos e mares. Também estão presentes na água não tratada e em produtos agrícolas, como legumes, vegetais e mel, e em intestinos de mamíferos, peixes e vísceras de crustáceos.
A bactéria entra no organismo por meio de machucados na pele ou pela ingestão de alimentos contaminados.
Embora raros, há descrição de casos de botulismo acidental associados ao uso terapêutico ou estético da toxina botulínica e à manipulação de material contaminado em laboratório.
O botulismo apresenta três formas: alimentar, por ferimentos ou intestinal.
Botulismo alimentar
Ocorre por ingestão de toxinas em alimentos contaminados e que foram produzidos ou conservados de maneira inadequada. Os alimentos mais comumente envolvidos são: conservas vegetais, principalmente as artesanais (palmito, picles, pequi); produtos cárneos cozidos, curados e defumados de forma artesanal (salsicha, presunto, carne frita conservada em gordura – “carne de lata”); pescados defumados, salgados e fermentados; queijos e pasta de queijos e, raramente, em alimentos enlatados industrializados.
O período entre a contaminação e o início dos sintomas pode variar de 2 horas a 10 dias, com média de 12 a 36 horas. Quanto maior a concentração de toxina no alimento ingerido, menor o período de incubação.
Botulismo por ferimentos
Uma das formas mais raras de botulismo é causada pela contaminação de ferimentos com C. botulinum. Esmagamento de membros; ferimentos profundos; ferimentos produzidos por agulhas em usuários de drogas injetáveis; lesões nasais em usuários de drogas inalatórias, são os tipos de ferimentos com mais possibilidade de serem contaminados. O período de incubação pode variar de 4 a 21 dias, com média de 7 dias.
Botulismo intestinal
Neste tipo de botulismo, os esporos contidos em alimentos contaminados se fixam e se multiplicam no intestino, onde ocorre a produção e a absorção da toxina. Em adultos, são descritos alguns fatores de risco, como cirurgias intestinais, Doença de Crohn e/ou uso de antibióticos por tempo prolongado, que levaria à alteração da flora intestinal. Não se sabe o período de incubação deste tipo da doença porque é impossível saber o momento da ingestão dos esporos.
Há, ainda, o botulismo infantil, que é, na verdade, do tipo intestinal e mais frequente em crianças com idade entre 3 e 26 semanas. Sua principal causa é a ingestão de mel de abelha nas primeiras semanas de vida.